terça-feira, 19 de maio de 2009
Paul Krugman, ontem: O Perfeito, o Bom, o Planeta
De uma certa maneira, era muito fácil se posicionar durante os anos Bush: os seus assessores e seus aliados no Congresso estavam tão determinados em levar a nação na direção errada que qualquer um podia, com a consciência tranqüila, se opor a todas as suas iniciativas.
Agora, no entanto, uma pouco usual coalisão de progressistas e centristas domina Washington, e tomar partido ficou muito mais delicado. As políticas tendem a mover as coisas na direção desejada, ainda que ficando aquém do que gostaríamos de ver. E a questão agora passou a ser quanto de compromissos, quanto de deixar passar coisas, alguém está disposto a aceitar.
Ainda se procurará muito pelas boas intenções dos que advogam a reforma do sistema de saúde. (Para mim, a questão fundamental é se será, ou não, incluída a opção de um plano público de saúde). Mas, agora, é a comunidade dos ambientalistas que tem de decidir quanto eles estão dispostos a negociar.
Se breve formos ter realmente ações no que tange ao problema do clima, será através das versões de leis propostas pelos deputados Henry Waxman e Edward Markey. A lei proposta por eles vai limitar os gases do efeito estufa exigindo que os poluidores recebam, ou comprem, permissões de emissão que deverão ser reduzidas gradualmente no tempo.
Não é preciso dizer que os mesmos membros da direita denunciam Waxman-Markey: aquecimento global é uma fantasia, impor limites nas emissões vai destruir a economia, blá, blá. Mas, a lei também tem opositores entre os ambientalistas que estão reclamando dos comprometimentos que os patrocinadores fizeram para ganhar apoio político.
Enfim, a lei de Waxman-Markey é boa o suficiente?
Bem, o Al Gore elogiou a lei e planeja organizar uma campanha de apoio das bases para ela. Um grande número de organizações ambientalistas, desde a Liga dos Conservadores que votam até o Fundo de Defesa Ambiental, também mostraram apoio à proposta de lei.
Mas, o Greenpeace declarou que "não pode apoiar essa lei na forma em que ela está atualmente". E alguns ambientalistas influentes, principalmente James Hensen, o cientista da NASA que foi o primeiro a chamar a atenção para a questão do aquecimento global, se opôs a idéia da lei sugerindo, ao invés, uma taxação das emissões de carbono.
Eu estou com o Sr. Gore. A proposta que está na mesa não é a da lei que gostaríamos, mas da lei que nós podemos conseguir ter - e é muito melhor do que nenhuma lei.
Uma observação - a afirmação de que a taxação das emissões de carbono é melhor do que a negociação de permissões de emissão - é, na minha opinião, equivocada. Em princípio, taxar as emissões ou criar um mercado para trocar permissões de emissão são igualmente efetivas em limitar a poluição. Na prática, a negociação de permissões tem algumas vantagens, em especial de conseguir uma cooperação a nível internacional.
Não querendo ir muito a fundo, apenas pense o quanto difícil seria verificar se a China estaria realmente implementando taxações sobre emissões de carbono, ou deixando os donos de fábricas com as devidas conexões no Governo ficarem livres das taxas. Em contrapartida, seria muito mais fácil verificar se a China, como um todo, está mantendo suas emissões abaixo de um certo nível.
A mais séria objeção a Waxman-Markey é que será estabelecido um sistema no qual muitos poluidores não teriam de pagar pelo direito de emitir gases do efeito estufa - eles receberiam essas permissões de graça. Em particular, nos primeiros anos de operação do programa mais de um terço da alocação de permissões de emissão seriam entregues sem custo para as indústrias de energia.
Porém, essas permissões gratuitas não colocariam em risco a efetividade do programa. Mesmo quando os poluidores recebem permissões gratuitas, eles ainda têm um incentivo para limitar suas emissões, pois assim fazendo eles terão permissões sobrando para serem vendidas para outros. Isto não é apenas teoria: permissões para emissão de dióxido de enxofre já são dadas de graça para empresas geradoras de eletricidade, ainda assim o sistema de negociação dessas permissões tem sido muito bem sucedido em controlar a chuva ácida.
Mas, claro, a doação de permissões efetivamente transfere dinheiro do contribuinte para as indústrias. Assim, se você acreditava em um programa de controle de emissões sem grandes custos políticos, Waxman-Markey é uma decepção.
Ainda assim, a proposta representa uma forte ação para a limitação da mudança climática. Como o Centro para o Progresso Americano observou, lá por 2020 a legislação teria o mesmo efeito do de tirar 500 milhões de carros de circulação. E por tudo que se vê, essa proposta tem uma real chance de se transformar em lei em futuro próximo.
Assim, os oponentes da legislação proposta devem se perguntar se não estariam tornando o perfeito um inimigo do bom. Eu acho que estão.
Depois de muitos anos de negação do problema, depois de muitos anos de inação, nós finalmente temos a oportunidade de fazer alguma coisa efetiva quanto à mudança climática. Waxman-Markey é imperfeita, desaponta em alguns aspectos, mas é o que podemos fazer agora. E o planeta não vai esperar.
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