segunda-feira, 11 de maio de 2009

Paul Krugman, ontem: Harry, Louise e Barack


Harry e Louise são dois personagens fictícios que apareceram na propaganda da TV da indústria de seguros em 1993, e que formavam um casal.

Eles se preocupavam com o que aconteceria se o Governo começasse a tomar decisões quanto ao seguro saúde. Os anúncios ajudaram a matar politicamente as reformas que o presidente Clinton desejava fazer no sistema de saúde americano, e ficaram como um símbolo da habilidade de grupos interessados conseguirem bloquear as reformas do sistema. Mas, fui chamado por pessoas do Governos que me disseram que agora o pessoal do Complexo Médico-Industrial (o termo é deles e não meu) está se oferecendo para ajudar.

Seis grandes participantes da indústria, incluindo America's Health Insurance Plans (AHIP), um descendente do grupo de lobby que patrocinou Harry & Louise no passado, enviaram uma carta ao presidente Obama apresentando um plano para controle dos custos dos seguros saúde. Mais, a carta parece apoiar muito do que a administração Obama vem dizendo a cerca da economia dos planos de saúde.

Há razões para ficarmos suspeitosos quanto a esse presente? Pode apostar que sim. Falarei sobre isso logo. Mas, primeiramente, podemos considerar pelas aparências que isso representa excelentes notícias.

Os signatários da carta disseram que estão desenvolvendo propostas para ajudar a cortar a taxa de crescimento dos custos em 1,5%. Pode não parecer muito, mas é enorme a economia. Alcança US$2 trilhões para a próxima década.
Como os custos devem ser contidos? Há poucos detalhes, mas, com certeza, eles devem ter andado lendo Peter Orszag, o Diretor do Orçamento.

Em seu emprego anterior, como Diretor do Orçamento do Congresso, o senhor Orszag argumentou que a América gasta dinheiro demais com certos tipos de custos de saúde que apresentam pouco, ou nenhum, benefício médico. Enquanto gasta muito pouco em outros tipos de cuidados como a prevenção e tratamento de condições crônicas. No geral, ele conclui que "há substanciais oportunidades de redução de custos sem afetar a saúde como um todo". A carta está de acordo com tudo isso.

Mas, antes de começarmos a celebrar, temos de fazer uma pergunta óbvia. Esse presente é um Cavalo de Tróia? Afinal, um grande número das organizações que assinaram a carta foram no passado os vilões das políticas de saúde na América.

Já mencionei a AHIP. Há também a Pharmaceutical Research and Manufacturers os America (PhRMA) o grupo de lobby que ajudou a passar o Medicare Modernization Act de 2003. Uma lei que proibia que o Medicare (INSS americano) barganhasse quanto aos preços dos medicamentos e permitia que fizesse gigantescos superfaturamentos para seguradores privados. Um dos signatários da carta é o outrora deputado Billy Tauzin que patrocinou aquela lei no Congresso e que, logo depois, abandonou o serviço público para se tornar um bem pago presidente da PhRMA.

O ponto é que temos todas as razões para duvidarmos da boa fé desses signatários. Lembrem-se de que o que o resto de nós chama de custos de saúde, o que eles chamam de receita.

O que provavelmente está acontecendo é que eles estão convencidos de que uma reforma do sistema de saúde vai acontecer independentemente da vontade deles e que se ficarem contra vão simplesmente ser excluídos de sentar à mesa de negociações. (Republicanos, acima de todos, ainda separam pesquisas entre as que são efetivas e as que não são, em um complô cruel para privar os americanos de seu direito de escolha.)

Eu conclamo a administração Obama a ser cuidadosa com as negociações que virão pela frente. Em particular, ser cuidadosa com a AHIP que certamente vai tentar usar a boa vontade criada pela postura do Governo voltada para controle de custos para matar uma importante parte da reforma do sistema de saúde: dar a opção aos americanos de escolherem entre pagarem pela previdência pública ou privada. A administração Obama não deve abrir mão desse ponto.

Mas, permitam-me não ser muito negativo. O fato de que um Complexo Medico-Industrial esteja tentando apoiar uma reforma do sistema ao invés de simplesmente tentar bloqueá-la já é uma tremenda boa notícia. Parece que América poderá obter finalmente o que a maioria dos países avançados já possui, um sistema de saúde que ofereça saúde básica para sua população.

E um sério controle de custos mudaria tudo, não apenas para a questão da saúde, mas para todo o sistema fiscal americano. Como o Sr. Orszag enfatizou, o aumento dos custos de saúde é o motivo porque no longo prazo os orçamentos parecem tão ruins. Basta diminuir a taxa em que os custos crescem e o futuro parecerá mais brilhante.

Eu ainda não vou contar com ovos que ainda não foram chocados. Mas, esta é uma notícia, das melhores, em termos de política de saúde que eu ouço nos últimos tempos.

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